domingo, 28 de março de 2010

Duelo de Titãs





























Finalmente uma novidade que irá agitar o mercado editorial da Psicanálise no Brasil: depois de muitas tentativas frustradas, saiu uma nova edição das Obras Completas de Sigmund Freud, traduzida por Paulo César de Souza e publicada pela Companhia das Letras.

Convenhamos, com mais de 30 anos de exclusividade nas mãos, a Imago não fez muito para consolidar sua posição no mercado. A versão brasileira da Standard Edition foi publicada em 1974 e não sofreu nenhuma revisão em todo esse tempo. Só mudaram as capas. A paginação foi ligeiramente alterada na versão de 1996 e lançaram versões em brochura dos textos mais importantes em separado. Por fim, lançaram a versão em brochura dos próprios volumes das obras completas. Mas simplesmente não fizeram absolutamente nada para corrigir as imperfeições e erros de tradução que se tornaram clássicos. É bem verdade que desde idos dos anos 1990 a Imago fez alguns movimentos para tentar lançar uma tradução nova. Alguns resultados isolados puderam ser constatados em alguns dos textos separados que foram lançados, com traduções direto do alemão de alguns autores de renome da área. Mas o projeto editorial completo demorou muito para ser finalmente levado à cabo. Só com a publicação do Dicionário do Alemão de Freud, da autoria de Luiz Hanns, começou a se mobilizar um projeto.

Em 2004 saiu então o primeiro volume da NOVA tradução, agora direto do alemão, das obras completas de Sigmund Freud. O projeto foi baseado na edição de estudos alemã, em um formato temático e com um número bastante grande de notas de tradução e novas notas editoriais, mantendo ainda as notas originais de Freud e as de Strachey (da Standard Edition). Isso gerou um texto bastante carregado, que só se justifica por ser propriamente uma edição de estudos dos textos freudianos. Os primeiros três volumes saíram entre 2004 e 2007, compondo a secção temática Escritos sobre a Psicologia do Inconsciente. A escolha foi interessante, pois privilegiou justamente os textos metapsicológicos mais importantes, que seriam justamente os mais necessários para estabelecer as novas escolhas terminológicas. Mas o impulso original perdeu seu ímpeto e chegamos a 2010 sem nenhum novo volume ser lançado.

Eis então a bem-vinda surpresa. Paulo César de Souza é um velho conhecido no que tange ao trabalho de tradução de Freud. Tinha feito uma excelente tese de doutoramento sobre o vocabulário freudiano que foi publicada como livro (As Palavras de Freud, oportunamente reeditado agora pela Companhia das letras) e tinha feito várias traduções alternativas de textos importantes de Freud que vinham sendo publicados em revistas especializadas. Era uma opção natural para bancar esse projeto da Companhia das Letras. Foram lançados três volumes simultaneamente agora em 2010, referentes aos números 12, 14 e 17. O projeto editorial não será temático, mas cronológico, como a Standard Edition Inglesa. Pretende abordar os mesmos textos "psicológicos" da versão Standard e também incluir as notas originais de Freud e de Strachey, mas tem um número mais restrito de notas novas, que são estritamente de tradução (a versão de Luiz Hanns apresenta notas com comentários teóricos feitas por consultores especializados). O curioso foi o lançamento dos três primeiros volumes fora de ordem, mas também entende-se que contemplam os textos metapsicológicos e teóricos mais fundamentais da obra freudiana.

Há, portanto, muitos textos em comum nos volumes lançados dos dois projetos, o que permite um bom cotejamento das versões. Ainda não me dei esse trabalho, mas posso dizer que qualquer que seja o resultado o fato de agora termos dois projetos editoriais concorrendo entre si só poderá trazer ganhos para os ávidos leitores brasileiros. Além do mais, a Companhia das Letras costuma ter bastante cuidado e zelo com suas publicações, o que certamente fará com que a Imago acorde do seu "sono dogmático" e melhore um pouco o padrão gráfico e editorial de seu material.


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